sexta-feira, 20 de agosto de 2010

A Arquitetura de Oscar Niemeyer, Genial e Humano- Brasília 50 anos.

Brasília não é simplesmente desenhada, é coreografada: cada uma das suas peças fluidamente compostas parece parar como um dançarino congelado em um momento de absoluto equilíbrio. Essa descrição, feita pelo premiado arquiteto Norman Foster, sugere a magnitude da obra de Oscar Niemeyer na capital federal. “Sua energia e criatividade não têm fronteiras, sua arquitetura é eternamente jovem”, já elogiou o inglês, para quem o carioca é uma fonte de inspiração. A mesma que levou o curitibano Jaime Lerner a cursar arquitetura e a conhecer Brasília em uma caravana estudantil, nos anos 60. “Sua genialidade vem da singeleza e da surpresa que suas obras causam”, analisa Lerner.


Niemeyer acrescentou suas curvas à paisagem árida e descampada do planalto Central e criou – sobre o Plano Piloto planejado por Lucio Costa – o conjunto arquitetônico moderno mais admirado no mundo. Arquiteto vivo com maior número de obras construídas, ele continua na ativa, com muita energia e lucidez, aos 102 anos completados no mês passado. Tanta longevidade também o fez acompanhar mudanças e propor alterações a sua obra, o que nem sempre se prova acertado. Em janeiro de 2009, uma polêmica mobilizou arquitetos, professores, o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) e até a opinião pública diante da proposta de um novo projeto na esplanada dos Ministérios. Uma torre triangular de 100 m de altura, próxima da rodoviária, celebraria os 50 anos da capital, anexa a um estacionamento subterrâneo e a um edifício baixo e curvo, o Memorial dos Presidentes. Entre os três, uma grande área pavimentada: a praça da Soberania. A aprovação imediata do governador José Roberto Arruda motivou críticas à realização de projeto público sem concurso de arquitetura. Em seguida, constatou-se que a obra feria o plano de Lucio Costa: ali, em local tombado pelo Patrimônio, nada poderia ser erguido. “Foi da maior elegância Niemeyer se dobrar e não ir adiante em um debate no qual ficou claro que a questão central não era a arquitetura, mas o urbanismo”, resumiu o diplomata André Corrêa do Lago, um dos mais respeitados críticos de arquitetura do país, depois de Niemeyer ter desistido da praça.





Visto pelo lado bom, o episódio estimulou a discussão sobre como preservar a cinquentenária cidade, única do século 20 tombada pela Unesco como Patrimônio Cultural da Humanidade. O fato é que o novo conjunto – tal qual a pirâmide de vidro encravada no Palácio do Louvre, em Paris – iria modificar a paisagem do eixo momumental e a vista do Congresso Nacional. “Hoje os grandes vãos não são mais considerados arquitetura”, nota Rodrigo Queiroz, estudioso de Niemeyer e professor de pós e de graduação da FAU-USP. Por isso, ele acha que até o mestre propõe construir para ocupar o espaço. “O maior inimigo da obra de Niemeyer é ele mesmo. Quando resolve intervir nela, acaba depondo contra a virtude de um projeto feito há 50 anos”, opina Rodrigo. E, com uma carreira tão extensa, é compreensível que nem todas as criações sejam geniais. “Neste período tardio da vida, ele produziu uma série de projetos que não estarão entre os melhores”, diz Rodrigo, que vê com desgosto o conjunto de Museu e Biblioteca Nacional, inagurado em 2006, e constata a repetição do mestre, que projetou mais uma vez uma lâmina horizontal e uma cúpula. “Não dá para comparar a qualidade do Itamaraty, por exemplo, com qualquer obra contemporânea”, comenta Andrey Schlee, professor gaúcho que se mudou para Brasília para estudar de perto a arquitetura de Niemeyer e há seis anos dirige a FAU-UnB. “A arquitetura perdeu em detalhes, em acabamento; a construção, mesmo superfaturada, é malfeita. As empreiteiras eram muito melhores. Palácios como o do Planalto e o do Alvorada só precisaram de restauro recentemente e o Museu Nacional tem poucos anos e já apresenta problemas”, lamenta Andrey, admirador dos monumentos que entraram para a história. “Ter obras maravilhosas e outras nem tanto não denigre sua imagem. Ele não é Deus, é um ser humano”, defende.

Niemeyer procurou sempre um equilíbrio entre o racional (em termos de tecnologia), o funcional e o estético. “Alguns dizem que ele não é funcionalista, mas essa crítica é infundada. É preciso observar a funcionalidade de acordo com a época em que a obra foi criada”, contesta o professor da UnB Cláudio Queiroz, que trabalhou dez anos para Niemeyer na Argélia (de 1973 a 1984) e diz que seus prédios podem ser adaptados. É verdade que há meio século palavras como sustentabilidade ou acessibilidade nem constavam do vocabulário. “O mundo mudou, isso não era uma preocupação. Nem a escada de incêndio era obrigatória”, ressalta Andrey, que esteve em agosto em Niterói, para assistir Niemeyer dar explicações por duas horas em um canteiro de obras. “A fórmula da longevidade dele é a paixão pela arquitetura, pelo trabalho. A determinação de vencer desafios e a vontade de inovar com o mesmo compromisso estético mantêm jovem esse homem com mais de 100 anos”, constata o arquiteto Jair Valera, sócio do escritório que desenvolve os principais projetos de Niemeyer.

Deve ser mesmo uma aventura observar de perto e acompanhar uma trajetória tão significativa. Que o diga José Carlos Sussekind, seu engenheiro calculista desde 1970: “Os projetos de Oscar exprimem o limite do que o concreto armado pode fazer. Sua audácia obrigou a engenharia brasileira a avançar. Reduzimos tudo: apoio, fundações. A arquitetura ficou mais simples e daí surge a obra audaciosa”. Além de manter o desenho ágil que faz da linha um movimento, Niemeyer permaneceu fiel aos ideais modernistas e socialistas ao longo de todas essas décadas. Talvez por essa coerência de princípios o homem e sua obra mereçam tanta admiração. “Existe uma combinação muito difícil: ser popular e grande artista. Isso é dado só aos muito grandes”, avalia o arquiteto Ciro Pirondi, professor da Escola da Cidade e conselheiro do Instituto Brasileiro de Arte e Cultura (Ibac). “Vale a pena refletir sobre qual país teríamos se ele fosse desenhado não só com a arquitetura, mas principalmente com os pensamentos e as ações de Oscar. Seria, no mínimo, um Brasil mais belo e justo.”








(Conteúdo para estudar para fazer a olimpiada de redação, Brasília 50 anos)






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